terça-feira, 4 de outubro de 2011

Greve nos Correios joga PT contra PT
04/10/2011
Por Raymundo Costa - E-mail raymundo.costa@valor.com.br

VALOR ECONÔMICO-SP
POLÍTICA

Há uma novidade na relação do governo federal com as greves no setor público. A direção dos Correios, que é do PT, resolveu endurecer - como nunca antes nos últimos sete anos - na negociação com os sindicatos da categoria, que é filiada à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Hoje a Justiça do Trabalho realiza a primeira audiência de conciliação, após 21 dias de greve dos carteiros. Ação de dissídio coletivo ajuizada pela ECT.

´´Em oito anos do governo Lula negociei seis greves, uma delas de 21 dias´´, diz o secretário-geral da Federação Nacional dos Trabalhadores nos Correios, José Rivaldo da Silva. ´´Negociamos com o próprio Lula e não houve desconto de dias parados. Houve compensação´´. A direção dos Correios não aceita fazer acordo em torno dos dias parados.

Rivaldo da Silva explica a distinção: ´´Os carteiros não pedem pura e simplesmente o pagamento dos dias parados, ao final da greve. Eles se comprometem a compensá-los trabalhando fora do horário normal do expediente´´. Aos sábados, por exemplo.

Dilma endurece com paralisações no funcionalismo

A impressão de Rivaldo da Silva é que a ECT colocou a questão do ´´desconto´´ na folha de pagamentos como questão de honra. Assim levaria os funcionários a pensar duas vezes antes de decretar uma greve no próximo ano. Nos Correios, a expressão empregada é ´´reeducação´´ do movimento sindical, para irritação dos sindicalistas.

A percepção de Rivaldo da Silva não é desproposital. A presidente Dilma Rousseff tem registrado ´´ameaças´´ de paralisações de algumas categorias de primeira linha do serviço público, como as de servidores da Polícia Federal e da Secretaria da Receita Federal, e a todos os ´´recados´´ tem respondido da mesma maneira: não vai ceder nas negociações: 2011 é igual a zero de aumento. Pelo menos nesses dois casos.

Os servidores da PF e da SRF integram carreiras de Estado e estão entre os mais bem remunerados do funcionalismo público, o que não é o caso dos carteiros. A ECT fez uma contraproposta: inflação do periodo (6,87%), mais R$ 50 de reajuste linear para todos e a inflação nos demais benefícios, como vale refeição, auxilio-creche. A proposta foi recusada pela categoria.

Os Correios estão na linha de tiro da presidente por outro motivo. A ECT é um dos três órgãos públicos nos quais botou um ´´xerife´´ para organizar a casa, desarrumada após anos de gestão rateada entre os partidos integrantes da base aliada do governo.

As outras duas são a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e Furnas Centrais Elétricas, não por acaso, até recentemente domínios do PMDB. Um escândalo nos Correios foi a ponta do fio do novelo que levou até o mensalão, o esquema supostamente de compra de votos (há quem diga que se tratou de caixa 2 de campanha) pelo governo Lula no Congresso.

O jogo duro da direção dos Correios é o que efetivamente ´´prejudica a população´´, diz Rivaldo da Silva, invertendo responsabilidade em geral atribuída aos grevistas, nos movimentos paredistas. São cerca de 40 milhões de objetos que deixam de ser diariamente entregues em todo o país. O desabafo de Rivaldo da Silva é feito na medida exata das dificuldades registradas na atual negociação.

´´O que o presidente da ECT, que é do PT, foi do Sindicato dos Bancários, Wagner Pinheiro, tá fazendo é terrorismo´´, diz Rivaldo da Silva. ´´Você sabia que ele antecipou o pagamento da folha, com descontos dos dias parados, só para fazer terrorismo, agitar ainda mais a categoria´´?

ACM ´´foi o nosso algoz´´, diz Rivaldo da Silva, referindo-se ao senador baiano Antônio Carlos Magalhães, ministro das Comunicações no governo José Sarney, morto em 2007) ´´ Ele (Wagner) é pior do que o ACM Nem ACM fez isso. Houve desconto com ACM, sim, mas até ele esperava terminar a greve para tomar uma decisão como essa. Nunca houve antecipação de folha de pagamento com desconto para apavorar´´.

Rivaldo participou de cinco negociações com o PMDB, ´´que a gente tanto quis fora da empresa´´. E nas quatro greves realizadas com os pemedebistas na diretoria, ´´a negociação era estabelecida, abria-se imediatamente um canal de diálogo, de negociação para achar uma solução, uma proposta aceita pela base´´, conta. ´´Infelizmente, com os companheiros do PT não estamos encontrando a mesma abertura para o diálogo. E, olhe que iniciamos a negociação da data base há 46 dias e até agora não chegamos a um entendimento, a uma proposta que fosse defensável nas nossas assembleias´´.

A reação do ministro Paulo Bernardo (Comunicações), a quem está subordinada a ECT, também deixou perplexo o comando de greve na empresa. Basta ver o espanto demonstrado por Rivaldo da Silva: ´´Ele disse que os trabalhadores dos Correios não estão de greve, mas de férias. Não falei que está pior do que na época do ACM e que é mais fácil negociar com o PMDB´´?

Sem acordo com o ministério nem com a presidência da ECT, os grevistas tentaram vias alternativas. Além da diretoria de Recursos Humanos dos Correios, os sindicalistas também procuraram o assessor para assuntos sindicais do ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral da Presidência), José Lopes Feijóo, que renunciou a uma vice-presidência da CUT para trabalhar no Palácio do Planalto. Deu em nada, muito embora os sindicalistas ressalvem que Feijóo tentou ajudar.

Digno de registro é o fato de que os trabalhadores nos Correios nem sequer pensaram em pedir a intermediação do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Há outras greves em andamento no país, como a dos bancários, mas nenhuma notícia sobre o envolvimento do ministro do PDT em negociações com os trabalhadores. Nem de que ele esteja fazendo falta à mesa.

´´A gente vê horizonte para conseguir um reajuste, mas não vê horizonte para se chegar a um acordo quanto a dias parados´´, diz Rivaldo Dias. ´´E a gente pensava que era gente nossa´´. De acordo com o sindicalista, o desconto dos dias parados ´´coloca mais combustível´´ na greve. ´´Lamentamos isso que está ocorrendo com a nova diretoria da ECT´´.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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